E grita toquem mais doce a música da morte a morte é um mestre/Que veio da Alemanha(…)
(Celan, Sete Rosas mais Tarde, 1996, pp. 16, 17)
A obra de Paul Celan, como sabemos, entrosa numa tradição poética que remonta a Wilhelm von Humboldt (1767-1835) e ganha uma notável expressão na hermenêutica de autores do século XX como Gadamer, Heidegger, George Steiner ou, ainda, Walter Benjamin. Não sendo filósofo, mas sim poeta, a sua obra convocou o pensamento de vários autores, que perfilham uma mesma “constelação” de pensadores. Não é de interesse enumerar todos os autores que tomaram Celan como matriz de pensamento, mas antes compreender o que filósofos e pensadores como Levinas (Levinas, 2003), Blanchot (Blanchot, 1984), Derrida (Derrida, 1986), Steiner, entre outros, inúmeros, foram beber em Celan e o modo como se “apropriaram” da sua obra. Se alguns tomam em Celan a questão ética do Outro – Levinas – e do Reconhecimento, outros abordam-no pelo lado do judaísmo (não no sentido redutor da Shoah), nos elos que se entranham e impregnam a linguagem celaniana, isto é, relativamente à ideia da simbologia e da visão cabalística da linguagem. Outros procurarão, ainda, a tradição hermética da linguagem e o modo como ela se enleia na poética celaniana. Na diversidade das perspectivas e nesse olhar caleidoscópico que incide sobre o autor, estão contidas várias portas de entrada, igualmente legítimas, contribuindo para pôr em relevo a importância e o significado do autor e da sua poética, bem como a inesgotabilidade (e actualidade) das possibilidades da sua leitura/interpretação. A sua linguagem é radicalmente hermética, bem como a simbologia do seu universo, o que exige do leitor uma atenção redobrada e um largo fôlego, que não se compadece com a leitura rápida. A crueza de uma linguagem que vive da dor latente da experiência do choque e da memória, nua e cortante como uma navalha acerada, recai sobre a própria língua e asfixia-a, desarticula-a, violentando-a para a obrigar a significar. Não é o embelezamento poético que Celan busca, mas a nudez da verdade, tal como ele a define no texto “Meridiano”.
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